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Uma resposta tardia

 
A chuva, a neve e o frio dos últimos dias apanharam-me desprevenida. Mas depois de vestir mais um par de camisolas percebi o quanto gosto de dias assim. Madrid é uma cidade com muito sol e a chuva mais parece uma anomalia que confunde todas as estatísticas e previsões.
São dias destes que arrasam com as nossas expectativas. E eu às vezes sinto-me assim, sinto-me a pessoa que baralha as previsões, aquela que não se comporta como devia...
Ontem, num reviver do passado recordei-me de um inquérito que preenchi no colégio à alguns anos. Lembro-me de duas perguntas em especial: Quais as tuas disciplinas favoritas? e Quais as disciplinas em que sentes mais dificuldades?
Ainda na minha inocência e sem qualquer pretensão recordo que a minha resposta para ambas foi: Português e Matemática.
Enquanto a minha professora recolhia os questionários lembro-me de ter parado para ler as minhas respostas. E passado pouco tempo vejo aparecer um sorriso incrédulo no seu rosto; então, como se estivesse a falar com uma criança que vive noutro planeta pergunta-me: Ana, como é que podes gostar das coisas com as quais tens mais dificuldades?

Lembro-me de sentir aquilo que mais tarde percebi ser humilhação, e fiquei calada porque ainda não podia formular resposta para essa pergunta. Duvido que mesmo agora a minha explicação seja satisfatória, mas acredito que os seres humanos evoluem para superar as suas próprias debilidades. Criamos aviões para nos movermos mais rapidamente, a medicina para curar mais rapidamente, a escrita para guardar as nossas memórias, os arranha-céus para chegarmos mais alto...
Constantemente vemos pessoas a desafiarem-se para ir mais longe. E nem por um segundo duvido que sentissem medo.

Multiplicam-se os especialistas, os livros, os estudos: crescemos com as crises que superamos, e a verdadeira evolução e mudança acontecem quando nos atrevemos a enfrentar as nossas próprias limitações. Já evoluímos tanto tecnologicamente, contudo, não poderemos ir mais longe se não nos mudarmos a nós próprios. Falta reconhecer que temos medo dessa mudança e seguir em frente.

Até porque duvido que se hoje voltasse a dar a mesma resposta a esse questionário, a reacção fosse diferente. E continuo sem perceber o que há de errado em gostar de desafios...
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Jornalista: ser ou não ser?


A minha ausência deste blog foi prolongada, e mesmo agora não estou segura se serei capaz de voltar ao meu antigo ritmo. Estes últimos meses estive totalmente concentrada em desenvolver as minhas capacidades.
O facto de falar e escrever constantemente o espanhol parece ser a melhor forma de aprender o idioma, no entanto não deixa de ser um caminho recheado de dificuldades. Sinto falta de me exprimir sem barreiras, há coisas que não consigo dizer e uma simples conversa pode deixar-me exausta (principalmente ao fim de um complicado dia). Há dias, no entanto que o difícil é o voltar à minha língua materna, e por vezes fico minutos num estado de extrema confusão sem ser capaz de articular algo que faça sentido.

Nunca pensei que ia mergulhar de cabeça no mundo do jornalismo, afinal de contas nunca me imaginei no papel de destemida repórter, tão bem explicado por Lois Lane no Super-homem, uma jornalista em busca da verdade. Infelizmente a imagem que a sociedade tem dos jornalistas é bem diferente desses tempos, passamos dos desgraçados em busca da verdade aos desgraçados que a desvirtuam... O pior dos preconceitos sociais é que são bastante rápidos em estabelecer-se quando negativos e muito difíceis de mudar (para coisas positivas).
De repente as más acções de uns são suficientes para rotular toda uma profissão. Mesmo José Socrates, à poucos dias, se lamentava do jornalismo de buraco de fechadura do nosso país.

Eu continuo alheia a esses preconceitos e já são suficientes as minhas atribulações. Há alturas em que não me sinto talhada para esta profissão, mas percebo que todos passam por dificuldades e que ninguém nasce ensinado.
Ainda no outro dia trabalhava numa reportagem sobre o Ano Internacional da Biodiversidade. Passei dias a falar com pessoas que não conhecia tentando ocultar o meu nervosismo. Ao fim de uma semana devo admitir que ganhei algum calo nestas coisas, comecei a ser mais atrevida e assertiva... fartei-me de ouvir as mesmas respostas e fartei-me das imensas chamadas que caíram no vazio.
Tenho muito para aprender ainda e o único que me chateia é o facto de não ter ajuda. Tenho aprendido com as minhas quedas, com as vezes em que vou pelo caminho errado e com as vezes que bato com a cabeça na parede.

Acredito que esse tipo de ensino é mais produtivo que qualquer outro, mas eu não me sentia nada preparada e, acima de tudo, nunca tinha experimentado trabalhar com tanto gosto apenas para ver o meu trabalho destroçado pelas críticas. Como sempre, terei que continuar a tentar.
Ao menos percebi uma coisa, se vou trabalhar algum dia, se me vou especializar em algo, mais vale que o faça na área que mais gosto, na área que mais me motive a trabalhar. Nunca serei capaz de trabalhar para que aprovem o meu trabalho, percebi finalmente que a realização pessoal parte de nós próprios. A aceitação virá depois, ou pode nunca aparecer. O importante é que eu seja capaz de dar valor às minhas tentativas e fracassos, o resto é dispensável.

Lancei-me na blogosfera espanhola com a minha nova página de divulgação científica. Sinto-me imensamente motivada com este atrevimento. Claro que no início tinha a certeza de que tinha perdido o pouco juízo que me resta. Mas agora sinto que foi a decisão certa a tomar, não sei o que me aguarda no futuro, nem sequer tenho planos para depois do mestrado. Por isso decidi apostar em mim, crescer por mim mesma nem que seja pelos erros que vou cometendo, até porque uma pessoa que nunca fracassou não está preparada para lidar com as suas próprias debilidades.

P.S. sinto saudades de Portugal, por isso decidi começar este post com uma música que surpreendeu bastante e é uma das minhas favoritas desde que a ouvi pela primeira vez.
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