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Percebendo a inteligência emocional

O conceito de inteligência emocional é tudo menos recente, mas parece-me que a maioria das pessoas continua a ignorar o seu significado e importância nos dias de hoje. Durante todo o meu percurso académico os professores apenas se concentraram e preocuparam com o desenvolvimento da inteligência cognitiva, tudo o resto tornou-se irrelevante. O que me leva a pensar que o nosso conceito de inteligência está longe de ser completo.

Inteligência é mais como uma lente que molda a forma como vemos o mundo do que uma capacidade inata. É algo que vamos construído ao longo da nossa vida.

O problema de ver o mundo através de um só tipo de lente é que acabamos por ignorar todas as outras possibilidades. O uso excessivo do petróleo é um exemplo das desvantagens de ver o mundo apenas desde uma perspectiva. A verdade é que o ouro negro tornou-se um símbolo de sucesso e de evolução tecnológica. Mas agora, numa época em que o seu uso trouxe consequências desastrosas para o futuro do planeta, não posso parar de pensar que, talvez, o facto de termos focado o nosso olhar apenas no petróleo e nas suas possibilidades, nos impediu de olhar para tudo o resto.


Whale oil tanks in South Georgia (fotografia por Ville Miettinen)

É como se tivéssemos passado décadas e ver o mundo através de um vidro negro e, de repente, com a explosão das energias renováveis percebêssemos que, afinal, o mundo está repleto de muitas outras cores e possibilidades. Talvez se passe o mesmo em relação à inteligência, talvez em poucos anos possamos reconhecer que existe inteligência em todos os seres humanos, e que esta capacidade é versátil e variada; não uma forma estática de ver o mundo que pode ser medida através de obsoletos questionários (que para mim não passam de uma farsa).

No entanto, para já a inteligência emocional, como tantas outros tipos de inteligência descobertos ou ainda por descobrir, continua a ser motivo de chacota em muitas áreas do conhecimento humano. Mas a verdade que muitos se esforçam por ignorar é que nenhum de nós está imune ao poder das nossas emoções. Como lidamos com elas é outro tema.

É a capacidade de reconhecer, aproveitar e controlar o poder das emoções que permite o desenvolvimento da inteligência emocional. E antes de percebermos a sua importância para alcançar uma vida completa e equilibrada, há que perceber quais os mecanismos que mais utilizamos para lidar com as esses sentimentos. Por isso dividi os mecanismos mais importantes em três categorias:

  • Repressão
Um mecanismo de defesa do ego, bem descrito por Sigmund Freud, que tem o poder de apagar ou afastar do nosso consciente acções ou emoções dolorosas ou inconvenientes. Embora esquecer possa parecer a opção ideal em certos casos, a verdade é que não podemos realmente apagar uma emoção. Suponho que tenha aprendido essa lição à custa dalgumas quedas.

Um sentimento não perde a força pelo simples facto de o afastarmos. A nossa mente é de uma dimensão assombrosa, costumo pensar na minha como um gigantesco armazém imerso na escuridão. Já a nossa consciência é semelhante a uma pequena lâmpada que ilumina pouco mais do que alguns centímetros à sua volta. Lá porque algo não está ao alcance dessa luz não significa que não exista e tampouco deixa de ser importante. Seria o mesmo que afirmar que o mundo se acaba quando imerso na escuridão.

Luz no escuro (fotografia por Luis Magina)


Quando menos esperamos esses sentimentos que tentamos esquecer voltarão em força para nos derrubar.

  • Subordinação
Todos conhecemos a sensação de ter as emoções à flor da pele, há momentos que, pela sua intensidade são capazes de destruir em segundos as barreiras que construímos para nos defender. Por muito forte que seja essa barreira entre o nosso verdadeiro ser e o mundo lá fora, há momentos em que a sua força falha e aquilo que nos esforçamos por esconder vai encontrar o seu caminho para o exterior.

No fundo, nessas alturas tornamo-nos os subordinados e as nossas emoções os mestres. Não é invulgar sentirmo-nos traídos pelo nosso próprio corpo, sentir que passamos a ocupar um lugar nos bastidores em vez de nos levantarmos gloriosos para mais um acto no imenso palco da nossa vida. Por isso nos sentimos vulneráveis, frágeis, expostos. Por vezes, como um recém-nascido enfrentando uma tempestade.

  • Compreensão
Ao contrário das duas categorias anteriores, o processo de compreensão das emoções é um processo consciente. Compreender é quase uma forma de experimentar as emoções, de vivê-las e de aprender com elas, em vez de deixarmos que as emoções nos experimentem a nós. Trata-se de encontrar o equilíbrio entre a repressão e subordinação. Não devemos deixar que as emoções controlem todas as nossas acções senão tornar-nos-emos meros fantoches, tampouco devemos ignorar por completo essas emoções, porque elas não desaparecem só por serem mantidas no escuro.

Para compreendermos os nossos sentimentos por vezes é necessário criar uma certa distância entre nós e o acontecimento ou pessoa que o desencadeou. Não só uma distância física mas também emocional. É preciso registar as nossas primeiras impressões sobre aquilo que estamos a sentir (por exemplo, em papel) e deixar passar um tempo até que as possamos analisar com objectividade.

Suponho que nada disto seja novo para qualquer um de vós. No entanto, pergunto-me quantos de nós fazemos isso realmente. Por vezes ficamos irritados sem razão aparente e deixámo-nos levar pela força do momento, apenas para sentir uma pontada de remorso quando o momento passar. É tão mais fácil deixar passar uma tempestade do que rastejar até à sua origem para perceber o que a provocou.

Incrivelmente passamos grande parte do nosso tempo a mentir a nós próprios, porque às vezes a verdade é mais dura e a mentira mais doce. Mas depois de uns tempos a contar mentiras a nós próprios provavelmente sentiremos que estamos a construir a nossa personalidade e a nossa vida sem bases verdadeiras, e uma vida assim não pode prosperar.

Para ilustrar aquilo que estou a tentar explicar prefiro contar uma pequena história:

Jorge era um adolescente como outro qualquer, pelo menos há primeira vista. Enquanto se passeava pelos corredores da escola, as sapatilhas gastas e as mãos vazias, qualquer pessoa olharia para ele e veria nada mais do que um adolescente rebelde e despreocupado.

Mas o observador mais atento perceberia a dureza dos seus olhos e a forma como o canto da sua boca se retorcia de malícia enquanto contemplava os seus companheiros. Se passássemos mais algumas horas com ele iríamos perceber que este jovem mais parecia um íman irresistível de problemas.Qualquer situação de maior tensão era suficiente para irritá-lo.

Depois de meses a observá-lo sentiríamos que Jorge estava sempre tão zangado que em todos os passos que dava apenas parecia querer mostrar a sua revolta contra o mundo. Apesar das suas atitudes, os seus colegas e professores nunca conseguiram perceber as razões por detrás de tanta agressividade, e, sejamos sinceros, duvido que tenham sequer tentado.

Um dia ao voltar para casa das aulas Jorge parou à porta de uma pequena mercearia. Comprou aquilo que parecia ser o jantar e ao trocar umas palavras com o idoso que ocupava o outro lado do balcão um sorriso genuíno formou-se no seu rosto. O senhor Gustavo conhecia Jorge desde pequeno e era das poucas pessoas que, independentemente do mau feitio do rapaz, era capaz de o fazer sorrir.

Jorge seguiu o seu caminho, o sorriso a desvanecer-se lentamente enquanto se aproximava de um edifício de aspecto decrépito e bolorento. Tirou a chave do bolso e entrou pela porta que parecia prestes a desfazer-se ao mínimo toque. Os vizinhos do 2ºB estavam a discutir novamente, com os filhos a chorar em plenos pulmões, todo o prédio estava mergulhado numa melodia capaz de enlouquecer o mais são dos homens.

O nosso jovem subiu as escadas como tinha feito tantas vezes ao longo dos últimos anos, alheio aos ruídos que lhe furavam os ouvidos. Ao chegar ao terceiro andar parou em frente ao 3ºB indeciso ou talvez assustado. Jorge fechou os olhos e lançou um prolongado suspiro. Mergulhou a chave na fechadura e entrou.

A sala estava mergulhada na escuridão e o odor a álcool e a vómito eram sufocantes. Dirigiu-se apressado à cozinha, pousou as compras cuidadosamente. Encheu um copo com água, o único copo bom que restava naquela casa, e dirigiu-se de novo para a sala. Agora os seus lábios não se torciam num sorriso sarcástico como tantas vezes acontecia quando o víamos passear pelos corredores da escola. Agora os seus olhos brilhavam de medo, já não parecia o mesmo rapaz que tinha entrado no edíficio à escassos minutos, parecia apenas uma criança frágil e assustada.

Foi ao encontro do vulto que estava deitado no sofá da sala. Lenta e carinhosamente retirou-lhe a garrafa de whisky das mãos e juntou-a àquelas que se acumulavam em cima da mesa. Pegou no rosto da sua mãe e sussurou: “Bebe um pouco de água mãe, vais-te sentir melhor”. A única resposta foi um grunido.

Jorge dirigiu-se para a cozinha de novo. O jantar cozia no microondas enquanto mudava para a roupa de trabalho. Sentou-se à mesa e, debaixo daquela fraca luz amarela eu podia jurar que chorava.

A história de Jorge é pura ficção, embora suspeite que seja a realidade de alguns jovens neste mundo. O que quero mostrar com esta história é a força dos sentimentos, mesmo quando nos esforçamos para os esconder. Ainda que Jorge reprimisse a sua angústia por ter uma mãe alcoólica e um pai ausente, essa angústia tornou-se uma raiva poderosa com a qual se escudava do mundo, atacando todos indiscriminadamente, menos a fonte da sua tristeza.

Por vezes agimos de uma forma, pensando que estamos a ser completamente sinceros connosco próprios, e, na verdade, apenas estamos a evitar olhar para a raiz das nossas angústias e preocupações.

Estou ansiosa pelos vossos comentários.
Até breve
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Redefinições na revolução da mente

Depois de quase dois meses sem actualizar este blogue não posso expressar as saudades que senti. Suponho que quando encontramos algo que gostamos tanto não nos conseguimos afastar por muito tempo.

Esta longa pausa não foi uma pausa programada, por isso devo um pedido de desculpas a todos os meus leitores. Mas foi uma pausa necessária por várias razões: tive de concentrar-me na investigação e escrita da minha tese e não estava a ficar satisfeita com a evolução da minha escrita e dos meus temas no blogue. Talvez tenha sido impressão minha, mas senti que me estava a afastar da minha verdadeira voz em vez de me aproximar dela. Ou se calhar sempre escrevi assim e só agora me apercebi do quão incompletas e vazias parecem as minhas palavras.

Apesar de tudo senti imensa falta de escrever aqui, tornou-se num bom hábito que apenas desejo manter. Não sei o que vai acontecer nos próximos meses, não sei se a minha carreira e estudos me vão obrigar a estar ausente de tempos a tempos, mas sei que desejo manter este blogue independentemente dos lucros e do número de leitores que consiga alcançar. Sei que quando escrevo sou feliz, por muito lamechas que isso pareça, e esse é o único objectivo que pretendo cumprir de momento.

Talvez me falte a experiência de vida e a credibilidade de uma autora consagrada para ter o direito de escrever sobre os temas que escrevo. No entanto, neste tempo que estive ausente e atormentada com esse pensamento percebi que isso nunca me poderia impedir de escrever.

Eastern Screech Owl por Michael Hodge


No principio deste blogue quanto mais pesquisava e lia sobre desenvolvimento pessoal mais um pensamento ganhava forma na minha mente: “que mais posso eu acrescentar que já não tinha sido dito ou escrito pelas centenas de autores e oradores do desenvolvimento pessoal?”. Nas minhas deambulações pela internet comecei a sentir que não havia espaço para mim. Aos poucos isso foi devorando a minha motivação sem que me apercebesse - imagino que isso aconteça à grande maioria dos que empreendem numa tarefa que exiga inovação e criatividade.

Por incrível que pareça, depois de ter visto tanto do meu lado escuro durante a minha conturbada adolescência senti que as dúvidas quanto às minhas capacidades não eram importantes. Por isso decidi regressar, desta vez nos meus próprios termos: sem a pressão da publicação semanal ou de um criar um blog especializado e monotemático. Não pretendo competir com ninguém por um espaço ao sol.

No entanto isto não significa que passe a publicar uma só vez por mês, pelo contrário, percebi que se o blogue não for um compromisso poderei dar muito mais de mim. Suponho que, no meu caso, a criatividade e o stress não sejam uma combinação vencedora.


A saga da ginástica emocional...

Nos últimos tempos, ao recordar os dias escuros da minha adolescência não pude deixar de me sentir grata por ter experimentado tanto do meu lado negro e aprendido tanto com ele. Foi nos momentos de angústia e crises existenciais que comecei a escrever e desde aí nunca mais parei (acho que nunca o tinha dito a ninguém!).

Nos meus 13 - 14 anos, bastante estranhos e atormentados, a minha escrita ganhou contornos líricos e profundamente dramáticos. Claro que nesse momento estava longe de o perceber, mas agora entendo que foram os sentimentos e as emoções intensas que tentava passar para o papel que deram vida própria às minhas divagações.

Nessa idade deixava-me governar pelas emoções ao ponto de sentir que a vida era apenas uma sucessão de tragédias às quais apenas podia sobreviver. Há algo de terrivelmente belo no sofrimento humano: revela o que há de verdadeiro em nós. Talvez por isso tenha ficado tão terrivelmente curiosa sobre a influência das emoções na nossa vida.

Uma vez li que as ciências sociais não são mais do que a descrição da sociedade de acordo com a visão e valores do investigador. O que significa que todos temos um pouco de investigador social em nós, porque cada um de nós interpreta o mundo de formas diferentes. Na realidade, parece-me que existem tantas interpretações como pessoas neste mundo, porque teria a minha mais valor do que a dos meus vizinhos?

Foi por isso que decidi escrever nos próximos dias aquilo a que chamo: a saga da ginástica emocional. Ignoro se o termo já terá sido usado por algum guru do desenvolvimento pessoal, com a abundância de blogs no tema imagino que sim. No entanto, o meu objectivo, mais do que expressar a minha opinião é mesmo saber a vossa. Tenho imensa curiosidade em saber quais serão as vossas reacções sobre um tema que anda nos lábios do mundo.

Nos próximos tempos tenho planeado escrever sobre três tipo específicos de emoções ou sentimentos, que para mim, resumem as causas dos meus problemas e esclarecem a origem dos meus receios:


  1. Agressividade
  2. Culpa
  3. Depressão

Podem deixar mais sugestões nos comentários e espero sinceramente que me possam acompanhar nos debates dos próximos dias.
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