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Dicas para os viajantes solitários

Nota: Escrevi a primeira versão deste artigo na passada quinta-feira, no parque do Retiro em Madrid, numa curtíssima viagem solitária que me deu muito que pensar.

Para mim existem, indiscutivelmente, dois tipos essenciais de viagem:

  • As viagens do tipo: “quero fugir da minha rotina e ir trabalhar para o bronze numa praia qualquer onde ninguém me possa encontrar”

  • E as viagens do tipo: “à descoberta”

[caption id="attachment_900" align="aligncenter" width="560" caption="A viagem, em rascunho | Imagem própria"][/caption]

Não quer dizer que as viagens do tipo “à descoberta” não possam servir de pretexto para fugir à rotina. No entanto, este último tipo de viagens costumam ser melhor planeadas e as expectativas de quem nelas embarca costumam ser muito superiores.

E, dependendo das expectativas e planos de cada um existem também vários tipos de turistas:

  • Os turistas tipo excursão,
    Que, para onde quer que se virem estão sempre rodeados por uma multidão de gente em roupas confortáveis, chapéus e câmaras fotográficas.

    Este tipo de turistas podem não ser os mais abundantes, mas chamam muito a atenção. Principalmente porque uma multidão em excursão é irritante como um bando de moscas e suscita nos outros uma vontade imensa de fugir…

  • Os turistas tipo microondas,
    Do género: Pões a comida no microondas, marcas dois minutos e já está! Estes turistas têm um objectivo muito simples em mente: ver o maior número de atracções no menor tempo possível.

    Não digo que seja errado. Já dei por mim a viver esse tipo de situações. Alguns lugares são tão imensos e cheios de história que se torna quase impossível resistir à tentação.

    O problema deste tipo de turismo é que acabamos por perder a melhor parte da experiência. Não temos qualquer ideia daquilo que estamos a ver, só sabemos que é um monumento conhecido e que agora teremos uma foto a provar que estivemos lá, em carne e osso. Mas continuamos a saber tanto sobre o lugar como sabíamos antes de termos posto lá os pés.

  • Os turistas por vocação,
    São turistas que demonstram um interesse genuíno pela história e cultura locais. Não se conformam com as rotas estabelecidas. É um tipo de turismo enriquecedor em que os turistas sabem encontrar o equilíbrio entre o tempo passado a conhecer o lugar e o tempo passado a viver o lugar.

E depois, dentro destes dois últimos grupos de turistas podemos distinguir os que têm companhia dos solitários.

Os solitários ou marginais, não têm um grupo que lhes proporcione protecção. Não têm a companhia de amigos e, a maior parte das vezes, são mal encarados pelos outros tipos de turistas. Especialmente porque esses gostariam de ter tomates suficientes para se fazerem à estrada sozinhos…

E é para quem gostaria de experimentar (ou já experimentou) a viagem solitária “à descoberta” que eu desejo escrever.


Um bom motivo para ser um viajante solitário


Viajar é uma actividade rodeada por uma aura quase mística. Algo que a maior parte de nós, comuns mortais deseja, embora não saibamos bem porquê. Algo com que muitos sonham, mas poucos realizam.

Isto porque viajar é aterrador. Se formos para um sítio “turístico” com grandes praias, buffets e serviço de quartos, sabemos com que contar. Esse tipo de turismo “turístico” é como um bálsamo de acção rápida para a nossa rotina e carreira esgotantes.

Mas é algo que dificilmente nos enriquece e muda. Esse tipo de viagem proporciona boas memórias. Mas raramente nos leva a pensar profundamente sobre nós e sobre a vida.

As viagens enriquecedoras não precisam de ter como destino sítios exóticos. Não exigem anos de poupanças, apenas: bom planeamento, coragem e força de vontade. Então, porque raios é tão difícil encontrar companhia para este tipo de aventuras?

Bem, a verdade é que os nossos amigos hão-de ter sempre muito trabalho, problemas financeiros, dilemas pessoais e outras desculpas quaisquer para não terem que alinhar nos nossos planos de viagem malucos.

Alguns alinham. É verdade. Mas se queres que viajar seja uma actividade constante na tua vida não te podes contentar com as raras vezes que alguém está disposto a pegar na mochila e ir contigo à procura do fim do mundo.

Porque esse tipo de viagens é aterrador. Imprevisível. Mágico. E portanto, exige coragem, muita coragem e uma mente aberta.

As dicas, sem mais demoras…


1. Planear, planear, planear

A primeira viagem a solo pode ser uma experiência aterradora. Eu sei que o foi para mim. E continuo a sentir-me maldisposta sempre que tenho que ir sozinha para um sítio novo e desconhecido. Mas não é por isso que vou deixar de o fazer.

Algo que me ajuda imenso é ter sempre um plano. Sou uma medricas, confesso. Tenho muito medo de viajar sozinha. Quando tenho um plano de viagem bem estruturado mal tenho tempo para ceder ao medo da solidão.

Se tiveres um bom plano, sabes que tens que ir de A para B pelo caminho X. Tens objectivos e esses objectivos põe a tua mente a trabalhar de forma construtiva. Com um plano podes superar o teu medo do desconhecido. Porque, aconteça o que acontecer sabes que o plano não te vai falhar, é a tua bússola.

Para fazer um bom plano ajuda ter um bom guia, um bom mapa e, se possível conhecimento de quem já visitou o teu local de destino. E, como é óbvio, a internet é um lugar fabuloso para encontrar todo o tipo de informações.

Não tenhas medo de perder tempo a elaborar o teu plano. É algo que vai tornar a tua confiança mais sólida e te vai tornar menos susceptível a sofrer de angústia com os percalços de qualquer viagem.


2. Se tiveres um medo particularmente forte de algo que te possa acontecer em viagem – precavem-te.

Pensa antecipadamente naquilo que farias diante de determinada situação. No caso improvável do teu medo acontecer estarás mais do que preparado para lidar com ele.

Podes confiar no teu plano em vez de depositares a tua confiança no raciocínio distorcido que acompanha sempre momentos de pânico. Pergunta-te seriamente: Se isto acontecesse, o que poderia eu fazer para atenuar as consequências?

Pensa em várias alternativas. Eu sei que estes planos se podem revelar completamente inúteis na tua viagem. Porque, num mundo desconhecido é impossível prever aquilo que pode acontecer. Mas se fores precavido estarás a reforçar a tua confiança enquanto viajante solitário.


3. Procura conselhos de quem já fez viagens do tipo “à descoberta”

Ninguém tem que nascer ensinado. E tendo em conta que viajar à descoberta é uma actividade complexa que exige empenho é errado desejar que tudo corra bem à primeira.

Ter a experiência de outros pode fazer toda a diferença. E ajuda a tornar a viagem muito mais agradável e produtiva.


4. Viajar não muda a tua personalidade, apenas potencia o que já lá está

Viajar é quase uma desconstrução da personalidade de cada um. Os viajantes podem sentir que afinal, aquilo que tomavam como certo ou aquilo que pensavam saber sobre si mesmos não está nem perto da realidade.

[caption id="attachment_909" align="aligncenter" width="560" caption="Parque do Retiro, Madrid | Imagem própria"][/caption]


A minha dica é que mantenhas as tuas expectativas controladas. Caso contrário arriscas-te a ter uma valente desilusão.

Viajar, e mesmo viver noutro país não é solução mágica para nenhum dos teus problemas. Aliás, quando saímos da nossa zona de conforto o mais certo é que trazermos os nossos problemas connosco.

O fantástico da viagem é que nos permite reescrever aquilo que somos. Mas isso demora o seu tempo.


5. Carrega algo que te faça sentir seguro

A não ser que planeies fazer uma viagem ao Texas não te recomendo que carregues uma arma, ok?

Mas para qualquer outra parte do mundo, levar um objecto pessoal que nos lembre a nossa casa, ajuda a que nos sintamos seguros. O objecto não precisa de ser sempre o mesmo, o ideal é que esteja à vista, ou acessível e que te transmita a sensação de que não estás sozinho e desligado do mundo.

Ás vezes esse objecto pode ser um telemóvel que, com um simples clique te pode pôr em contacto com alguém que ames. Pode ser uma máquina fotográfica, uns óculos de sol. Podem ser coisas banais aos olhos dos outros, coisas que só tu entendas o significado.

Assim que já tenhas alguma experiência em viagem, gradualmente, deixarás de precisar tanto desses objectos. Passarás a experimentar uma segurança interna que não necessitará de coisas externas para se manter forte.


6. Sai dos caminhos convencionais

Pergunta aos locais que sítios interessantes poderias visitar. E por locais digo, empregados de um restaurante onde pares para almoçar. O senhor que vende jornais, o dono do albergue onde fiques hospedado, alguém que encontres na rua e que tenhas a oportunidade de abordar.

Especialmente em meses de verão torna-se quase impossível desfrutar de uma boa viagem. Demasiados turistas com as suas câmaras e companheiros de excursão. Demasiado stress e confusão, pelo menos para mim.

Por isso, visitar sítios diferentes irá certamente proporcionar-te uma experiência diferente.


7. Perde-te

Mas convence-te que vais em direcção a algum lugar.

Para mim esta é parte mais difícil da viagem solitária. Por isso, sempre que quero perder-me, deliberadamente, levo um mapa. Caso contrário, o medo de estar perdida pode arruinar, por completo, a minha experiência.

Estar perdido é também uma das experiências mais poderosas de uma viagem solitária. Mas não te queiras atirar de cabeça se ainda não te sentes preparado.

Para te preparares podes escolher um caminho mais longo entre o local onde estás agora e aqueles que queres alcançar. Podes seguir uma intuição que te diz para virar à esquerda em vez de seguir em frente. Podes quebrar o teu plano. Parar em sítios inesperados e tirar fotos a situações que pareçam banais aos olhos das outras pessoas.

Todos os que andam perdidos vão para algum lugar, só que ainda não sabem que lugar é esse!


Ainda com medo de viajar?


Uma dica para o caminho: faz turismo na tua própria cidade. Tenho a certeza que existem dezenas de lugares inesperados que não sabias que existiam, prontos para serem descobertos.

A viagem solitária requer uma coragem que se constrói com o tempo. Sempre me disseram que era medricas e tímida demais para abandonar as sais dos meus pais. Então, à primeira oportunidade decidi ir sozinha para Madrid. Sobrevivi.

Se eu consegui, tu também consegues, tenho a certeza.

A todos os viajantes solitários: adorava ouvir as vossas dicas e experiências. A todos os que desejam viajar mas ainda não encontraram a coragem: adorava conhecer as vossas dúvidas.

Um grande abraço e até breve
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Ser escritor na era digital

Uma crença que muitos aspirantes a escritor carregam (incluindo eu, nos meus dias menos bons) é que apenas serão “bons” quando receberem alguma prova de que sociedade reconhece e aprecia o seu talento.

Isto porque a escrita é uma actividade que requer uma certa dose de solidão e vem acompanhada por alguma frustração. Depois de horas de trabalho, inocentemente, desejamos que toda a gente goste de nós.

É normal carregar essas expectativas. Afinal de contas, nos primeiros tempos estamos tão inseguros na nossa arte, que nos tornamos dependentes da opinião e atenção dos outros.
Calligraphy | créditos: Mark

A grande treta é que estas expectativas nos tornam emocionalmente instáveis. Se aparece alguém que nos elogia o nosso ego explode em proporções impensáveis, contudo, se, no momento seguinte aparece alguém que nos critica, tornamo-nos na pessoa mais miserável do mundo.

Viver a vida como uma bomba relógio emocional é algo que, gradualmente, vai enfraquecendo a nossa escrita. Por isso, em primeiro lugar é preciso que te libertes dessa montanha russa. E podes fazê-lo se reconheceres uma simples verdade:

Nem todos vão gostar de ti. E o mais importante é saber que as pessoas certas vão gostar de ti. Não precisas que o mundo inteiro te ame e te sustente para que possas viver da tua escrita. Vamos fazer um jogo:

Escolhe um número. Não um número qualquer, escolhe quanto gostarias de receber num mês pela tua escrita.

Já escolheste? Boa. Vou abrir o meu jogo contigo, o meu número mágico, nesta altura da minha vida é 3000€ (cerca de R$ 6800).

Podemos usar o meu número como ponto de referência. Imagina o valor mais baixo que podias cobrar por um produto teu (um livro, por exemplo): 1€ (cerca de R$ 2,29)? Significaria que 3000 pessoas teriam que te pagar 1€ por mês…

Achas que é muito?


Estima-se que a população mundial chegue aos 7 mil milhões no próximo ano. 3000 parece um número bem pequeno em comparação.

Mas nem precisamos de ir tão longe. Estima-se que já somos cerca de 240 milhões a falar português. 3000 é um número bem tímido em comparação, não te parece?

Fiz este jogo por uma razão muito simples: o mundo é imenso. Para seres bem sucedido não precisas que essa montanha de gente te reconheça, aplauda e dê dinheiro. Aliás, precisas apenas que uma pequena parcela da população o faça.

Por isso, em vez de te dedicares aos 240 milhões que nunca se vão importar com a tua escrita. Dedica-te aos 3000 para os quais a tua escrita estará carregada de significado.

A boa escrita é pessoal.


Caso contrário cairemos na asneira de praticar o politicamente correcto e passar a soar igual a todos os outros escritores.

Como se escreve chega, por vezes, a ser mais importante do que aquilo que se escreve. Nunca te aconteceu leres um livro com uma história banal e não o conseguires largar? E nunca te aconteceu sentir uma pontada de tédio num romance com uma história forte, mas com uma escrita fraca?

Portanto, vou voltar ao mesmo: uma escrita forte é pessoal. O pessoal – os teus sentimentos, crenças e experiências – é o que te diferencia dos outros escritores. E é com o pessoal que deves começar.

A escrita pessoal passa muito por umas atitudes muito simples:

  • Escreve para ti ou para uma pessoa que ames.Todas as outras pessoas não interessam. Porque escrever para encaixar numa audiência perfeita é suicídio criativo. Com a internet as tuas ideias podem chegar até aos confins do mundo, algures no teu caminho vais-te cruzar com pessoas que se sentem atraídas pelas tuas ideias. Pessoas à quais tens muito para oferecer.Podes tentar vender sapatilhas de corrida a um manco. Mas sabes que, na verdade, ele não precisa delas. Assim como um manco não precisa das sapatilhas, há muitas, aliás, imensas pessoas neste mundo para quais as tuas ideias são ridículas e desnecessárias. A essas não podes ajudar. Aceita isso. Porque não precisas de agradar a 7 mil milhões de pessoas… aliás, agora já sabes qual é o teu número mágico.

  • Deixa de lado o politicamente correcto.Escreve asneiras, palavrões, expressões sem sentido. Escreve, só porque podes. A boa escrita não é a escrita do “Maria vai com as outras”, a boa escrita tem que ser memorável. E para que a escrita se torne memorável ela tem que se mais do que uma espiral incansável de factos.Sê idiota por 30minutos. O que tens a perder? Não estou a dizer para insultares as pessoas, estou a dizer para largares aquela fera indomável que manténs cuidadosamente escondida de olhares indesejados. Para que a tua escrita seja memorável vais ter que a soltar.

  • Diverte-te. Sim, leste bem. Muito bem.Quando escrevemos apenas por compromisso, ou quando escrevemos aquilo que pensamos ser importante para os outros a escrita deixa de ser divertida. E se não te estás a divertir, é pouco provável que os teus leitores se divirtam.Quando já escreves há algum tempo é normal que os teus sentimentos mais profundos (mesmo aqueles dos quais não estás consciente) saltem para o papel. E se começas a ficar farto dum texto, o mais provável é que os teus leitores se apercebam disso e aproveitem a oportunidade para fugir.

  • Escreve quando não tens vontade.O que significa escrever? Não te estou a perguntar o que significa para ti. Imagina que tens que o explicar a uma criança pequena, em que termos o farias? Eu diria algo do género:Escrever significa agrupar palavras para que elas formem frases. E juntar frases para que elas formem parágrafos e textos. E este conjunto de palavras serve para dar forma a pensamentos.Portanto, escrever significa dar forma a pensamentos. E isso é difícil para caraças.

    Lembraste daquele dia em que estavas estupidamente inspirado e te sentaste a escrever? Escreveste durante horas, dando pulinhos de emoção com a adrenalina que te corria pelas veias.

    Quando não tinhas mais para dizer fechaste o caderno ou o computador e foste viver o resto do teu dia com um fervoroso entusiasmo. No dia seguinte vais ler o que escreveste e apanhas uma valente desilusão.

    O que se passou aqui foi muito simples: a tua mente acaba de reconhecer que a experiência de escrever foi melhor que o resultado. E isso significa que, instintivamente, tu sabes que podes fazer melhor, muito melhor.

    O que acontece é que isto de dar forma a pensamentos é mais difícil do que parece. Porque, na tua linda cabecinha os pensamentos não se manifestam apenas por palavras, por vezes aparecem misturados com sons, imagens, cheiros, sentimentos, memórias, associações. E, infelizmente é impossível transmitir todo o conteúdo da tua mente para um papel. Só ia servir para ficares louco e enlouqueceres a tua audiência no processo.

    Por isso é que é preciso escrever muito. Especialmente quando não te apetece ou sentes que não tens nada a dizer. É o mesmo que ganhar massa muscular. Pensa na tua habilidade para a escrita como um músculo. Se não lhe deres o alimento certo e não a treinares com frequência ela começa a atrofiar. E quando um momento de inspiração te rebenta nas mãos, se não tiveres o teu músculo treinado não vais ter forças para lidar com essa explosão.



Escrever na era digital é uma oportunidade tremenda. Não precisamos de agradar a meio mundo. Precisamos apenas de agradar a um punhado de pessoas.

Não precisamos de correr atrás de editores, podemos publicar por nós próprios. Não precisamos que os nossos artigos sejam aceites por um grande meio de comunicação. Agora basta carregar no botão publicar de um blogue para termos a nossa própria publicação.

Apesar de haver mais oferta e, portanto, mais competição, não é impossível viver da escrita. Porque, ao mesmo tempo que aumenta a oferta, abriram-se também milhares de novos canais de comunicação que nos permitem chegar à nossa audiência sem ter que lidar e agradar a intermediários.

O escritor na era digital tem grandes oportunidades, só tem que aprender a aproveitá-las. Não achas?
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9 razões para admirar a Lady Gaga

Stefani Joanne Angelina Germanotta sempre se sentiu uma estranha. Alheia à mentalidade que predominava entre os jovens da sua idade.

Ninguém podia prever que abraçar as suas qualidades únicas a conduziria a uma fama monstruosa. Da mesma forma que não poderiam prever que, aos seus 24 anos de idade, esta miúda nascida e criada em Nova York iria ser conhecida mundialmente como Lady Gaga.
Lady Gaga at CES 2010 | créditos: Lori Tingey

A minha admiração pela cantora e compositora não foi do tipo "amor à primeira vista". Na verdade, a primeira vez que ouvi as suas músicas pensei estar a assistir ao delírio de uma artista que tinha ido longe demais para se destacar da sua concorrência.

Mas os meses foram passando, o nome de Gaga correu o mundo e a sua fama não parou de crescer. Foi por aí que comecei a ficar intrigada: o que veriam os seus fãs naquela excêntrica que gostava de chocar com as suas roupas berrantes e comportamentos tão pouco convencionais?

Decidi começar a ouvir realmente aquilo que a artista tinha a dizer. O que descobri foi surpreendente. As atitudes fortes da cantora podem ensinar-nos inúmeras lições sobre sucesso e criatividade:


1. A personalidade e a história pessoal são importantes


Muitas pessoas tentam esconder as partes de si mesmas que as fazem sentir envergonhadas. Gaga não podia ser mais transparente. A sua história de vida é algo que ela nunca escondeu e isso fortaleceu a sua arte.

As falhas não enfraquecem as pessoas. Os defeitos são apenas excelentes pontos de partida para criarmos a vida que sempre sonhamos.

E o fantástico em explorar aquilo que nos torna diferentes reside no facto da nossa perspectiva única sobre a vida poder ajudar a libertar muitas pessoas.

Abraçar as nossas diferenças e distanciarmo-nos da "manada" é uma das coisas mais difíceis e dolorosas que qualquer ser humano pode fazer. No entanto, continuar a seguir a "manada" não nos levará a nenhum lugar inesquecível.


2. Valoriza os teus fãs


Gaga chama aos seus fãs de "little monsters". À partida pode parecer uma atitude narcisista. No entanto, apenas mostra que, para ela, os fãs não são apenas pessoas que gostam da sua música, são muito mais que isso. A artista comunica constantemente com os seus fãs. E, ao que tudo indica, por muito que a sua fama cresça Gaga nunca se esquece das pessoas que a ouvem e respeitam.

Muitos artistas vivem desligados dos seus fãs como se estes fossem um zumbido incómodo. Eles ignoram que o seu feedback é extremamente enriquecedor.

O contacto com outras pessoas traz-nos sempre uma perspectiva diferente sobre as nossas capacidades. E, para além de ser motivador pode ajudar-nos a crescer enquanto pessoas e enquanto profissionais.

A comunicação com aqueles que convivem de perto com o nosso trabalho desafia-nos sempre a superar os nossos feitos. Acredito que, para provocarmos um grande impacto na vida dos outros, primeiro, temos que deixar que os outros provoquem mudanças em nós.


3. Explora territórios "mortos"


Até agora os videoclipes eram apenas uma extensão das próprias músicas e, raramente, o vídeo trazia à música um novo significado.

Com Gaga os videoclipes são verdadeiros enigmas. A artista e aqueles que apoiam a sua carreira foram capazes de transformar algo estático que não trazia nada de novo, num novo meio capaz de enriquecer a própria música.

Nos tempos que correm os escritores (só para dar um exemplo) não se podem limitar a ser escritores e a viver na penumbra. Se querem realmente ter um impacto profundo no mundo não podem fazer exactamente o que os outros fazem. Têm que procurar novas formas de expressão que estão a ser descuradas pelos outros profissionais da área e explorá-las.


4. Define a tua mensagem


Muitas vezes tudo o vemos é o óbvio. É muito fácil criticar seja quem for se desconhecermos as suas razões para fazerem o que fazem.

Lady Gaga tornou-se poderosa e adorada pela mensagem que quer transmitir. Uma mensagem que é maior que ela própria. Gaga, que sempre se sentiu uma "freak" entre os seus pares transmite uma mensagem de amor-próprio e de aceitação das nossas diferenças.

Todos temos mensagens a transmitir. As nossas mensagens não podem ser ocas nem fabricadas. Têm que nascer das nossas próprias experiências e sentimentos.

Todos temos uma visão única do mundo e trazê-la à luz do dia pode inspirar muitas pessoas ou, pelo menos, mostrar-lhes que não estão sozinhas com os seus problemas e preocupações.

A nossa mensagem acaba por mudar com o tempo, porque a própria vida está longe de ser estática. No entanto, definir e explorar essa crença enraizada, poderosa e motivadora que temos sobre a vida pode ser um excelente combustível que nos ajudará a refinar os nossos talentos.


5. O sucesso não é a última paragem


Nos dias que correm a palavra sucesso é usada e abusada. No entanto, raramente mencionamos que, mais difícil que obter um certo nível de sucesso é mantê-lo.

O sucesso não é última paragem. Não é o local onde podem cessar todos os nossos esforços e nos podemos sentar e receber todos os louros pelos nossos feitos sem termos que mexer uma palha.

O sucesso é apenas mais um ponto de partida. Não deve ser nunca o nosso destino final. Porque não podes pegar no sucesso, arrumar as tuas coisas e desligar todos os teus projectos só porque cruzaste essa porta.

Uma das coisas que mais admiro em Gaga é a sua voracidade pela inovação.
créditos: Naomi Lir [CC-BY-SA-2.0], via Wikimedia Commons

Apesar dos bilhetes para a sua tourné mundial terem esgotado, Gaga continuou a ter prejuízo porque, mais do que um concerto, ela quis criar uma experiência enriquecedora, diferente e complexa para os seus fãs. Com o nível de sucesso que alcançou Gaga podia ter-se conformado com o formato habitual de uma tourné. Mas ela quis ir mais longe e dar mais do que aquilo que as pessoas esperavam.


6. Não olhes para trás


Gaga é uma "máquina" produtora de sucessos. E isso não acontece por a cantora passar dias a lamuriar-se sobre tempos passados e músicas falhadas (sim, ela teve algumas antes de começar a ter sucesso). As novas ideias não podem fluir se continuarmos agarrados às antigas.

Por isso é preciso definir um ritmo e prazos para nós próprios. Se estivermos constantemente à procura de novas ideias quase certamente não iremos cair no erro de nos agarrarmos a ideias antigas que falharam. A produção constante evita esse apego à criação passada e permite-nos manter sempre uma perspectiva fresca e original sobre o nosso trabalho.

Caso contrário corremos o risco de fossilizar. Ou seja, corremos o risco de parar de evoluir e de sofrer uma "morte criativa". E se isso acabar por acontecer o nosso sucesso tornar-se-á apenas uma lembrança que iremos recordar com carinho.


7. Nada importa se não estás disposto a arriscar


Lady Gaga arrisca muito ao expôr-se da forma que se expõe. É uma pessoa destemida que aceitou plenamente a responsabilidade pelas suas acções e não foge às consequências.

Para termos sucesso em áreas que exigem criatividade é necessário, mesmo para a nossa motivação, arriscarmos. Fazermos apostas altas e desenvolvermos a confiança nas nossas capacidade. Um artista que se esconde é um artista que não arrisca nada e que, por isso, não tem nada a perder. E isso não é inspirador para os fãs, nem é fonte de motivação para o próprio artista.

Se queres uma vida plena é preciso que aprendas a complexa arte de apostar alto nas tuas próprias capacidades. E, depois de o fazeres, é preciso também que te prepares para lidar com as consequências: sejam elas um estrondoso sucesso ou um miserável fracasso.

Arriscar passa muito por ser consciente de que temos muito a perder se não tentarmos um plano arrojado. Porque se não tivermos nada a perder, é difícil continuarmos a lutar motivados por um pedaço de ilusão.


8. Estuda casos de sucesso


Gaga pode parecer um pouco "gaga" (louca - tradução literal do inglês) devido às suas atitudes. Mas a artista não podia estar mais longe disso. Na verdade, ela considera-se uma estudiosa da arte da fama, e dedicou muito do seu tempo a tentar perceber como outros cantores obtiveram, mantiveram e perderam a sua fama.

A artista não dorme em serviço e é a prova de que o sucesso tem muito de planificação e muito pouco de sorte. O que não falta neste mundo são pessoas talentosas. Apenas temos que compreender aquilo que separa os talentosos bem-sucedidos daqueles que viverão, para sempre, na escuridão.

Não podemos esperar que o nosso talento cubra todas as nossa falhas. O talento não é a cola que mantém tudo unido, é apenas a matéria prima. Se queres alcançar o sucesso deves olhar à tua volta e procurar conhecimento e lições naqueles que conseguiram conquistar aquilo que tanto ambicionas.


9. Existem críticas que devemos ignorar


As escolhas e acções arrojadas de Gaga trouxeram-lhe uma legião de fãs e, com ela, um legião de críticos. Os críticos podem dividir-se. claramente em dois grupos:

  • Os críticos destrutivos: aqueles que a criticam por ser diferente e não se esforçam para a perceber;

  • Os críticos construtivos: pessoas que percebem bastante sobre música e arte e não se contentam com aquilo que ouvem dizer sobre Gaga, preferem antes investigá-la antes de formar uma opinião sobre o assunto.

No entanto, nos tempos que correm, parece que apenas existem críticos destrutivos. E Gaga têm-nos aos montes.

O que significa que uma certa dose de sucesso não torna os profissionais imunes a este tipo de críticas. Elas são o reflexo de uma sociedade que se torna cada vez mais superficial e intolerante.

Cada vez mais as pessoas têm uma opinião sobre tudo e todos. Contudo, essas opiniões raras vezes têm fundamento e factos para as apoiar. Vivemos numa época em que nos contentamos com os títulos e, automaticamente nos tornamos "peritos" num tema. E, sem sabermos estamos a deixar, gradualmente de pensar por nós próprios. O que nos torna vulneráveis à influência dos grandes meios de comunicação.


Conclusão


A mensagem que quero que leves deste artigo:

  • Nem tudo aquilo que te chega aos ouvidos é a única verdade.

  • Se queres sucesso e influência, primeiro tens que te deixar influenciar por aqueles que te rodeiam.

  • Se queres ser diferente não podes fazer aquilo que os outros têm feito e esperar resultados diferentes.

  • Sucesso requer planificação, mais do que talento.

  • Haverão sempre críticos destrutivos, porque eles são o reflexo de uma sociedade que, automaticamente excluí todos os que não se encaixam nas suas regras silenciosas.

  • Estuda bem o teu ofício e o percurso de outros profissionais: a resposta que procuras está lá.

O que pensas sobre Gaga e o seu sucesso?
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Como não passar o nosso tempo livre

Mathieu Ricard escreveu:
“Enquanto os teus dias são finitos, as actividades banais são como as ondas do mar – não se esgotam.”
em Art of Meditation


Com esta frase Ricard queria relembrar-nos da nossa mortalidade. E, com isso, expor a verdadeira natureza das coisas banais, às quais, muitas vezes nos entregamos sem esforço ou pena.

Ricard pensava em meditação enquanto escrevia esta frase. O pensamento, no entanto, continua válido para qualquer actividade humana que exija um distanciamento dessas banalidades. Como as actividades que requerem criatividade, disciplina e concentração.

A cow boy | créditos: Steven Kim



As actividades banais, em comparação, são fáceis.


Muito fáceis. Mantêm-nos ocupados, cativos e reféns dos impulsos que não nos esforçamos por entender.

E, numa era em que a rapidez parece ter substituído a concentração pela superficialidade, as banalidades ganharam solo fértil para crescer.

No entanto, existe um limite na quantidade de ar que podemos forçar para dentro de um balão. A partir daí o material tornar-se-á demasiado frágil. E mesmo que deixes de soprar, o balão jamais voltará à sua forma original.

Algo de semelhante se passa connosco.

Embora o nosso cérebro tenha uma brilhante capacidade de recuperação, à sempre um limite à quantidade de informação (banal ou não) que podemos absorver. A partir desse limite aguarda-nos um período de pesada apatia em que deixaremos de ser capazes de processar aquilo que se passa à nossa volta.

As banalidades não se esgotam mas deixam marcas em nós.


São leves porque são fáceis e, por isso, não sentiremos quaisquer dificuldades em iniciá-las. Basta um clique e estamos online no Facebook e quase nem gastamos calorias no processo.

E porque não nos custa começá-las é fácil perdermos a noção do tempo quando andamos de trás para frente entre páginas infinitas de informação que vamos absorvendo rapidamente como faríamos com comida num banquete.

Banalidades no fundo são actividades que consomem o nosso tempo (e dinheiro). São, na verdade, um mau investimento.

É quase como comprar um carro em tempos de escalada no preço do combustível. Por isso, fica um bocado ridículo pensar que essas actividades nos trarão frutos no futuro.

O Facebook, a televisão, as horas passadas a navegar na internet entre vídeos engraçados e notícias trágicas… São tudo coisas que nos preenchem, mas que nunca nos poderão alimentar.

O entretenimento é a palavra de ordem neste momento.


Quem sabe, daqui a alguns anos os historiadores nos classifiquem como humanóides sem cérebro que viviam fascinadas pela tecnologia sem serem capazes de se distanciar das coisas banais.

Mas já me estou a adiantar um bocado. O que eu queria dizer com toda esta história é que, no meio da banalidade quase nos esquecemos do que significa não fazer nada.

Os nossos tempos de ócio estão armados de entretenimento até aos dentes. E livrem-nos de ficar sem acesso à internet ou à televisão!

Vivemos saturados das notícias e, contudo, não somos capazes de nos distanciarmos desse dramatismo trágico que expõe o pior de nós de forma gratuita. Vivemos saturados de intrigas, mortes, corrupção, contudo, esse é o tema de conversa na nossa hora de almoço.

E ao vivermos saturados deixamos de viver de todo.

As plantas não crescem em solo esgotado. Por isso se praticou durante muito tempo o pousio.

Às vezes precisamos de praticar com a nossa mente esse pousio. Colocar o entretenimento em stand-by e, entregarmo-nos ao momento.

Ir às compras, dar um passeio no parque, cantar no chuveiro, comer um gelado, correr à chuva…

Ao afastarmos a nossa mente da torrente infindável de informação o tempo passa a correr mais devagar. A nossa criatividade tem finalmente a oportunidade para vir à tona. Depois de tanto tempo enterrada na lama, sufocada com a próxima tragédia do horário nobre.

Não acreditas em mim? Desafio-te a sair deste blog, a desligar o computador e ir espreitar a paisagem pela janela. Tenta vê-la como se fosse a primeira vez… Não te sentes melhor?

Nas eternas palavras de Horácio:
Carpe diem, quam minimum credula postero
(aproveita o dia, sem te preocupares demasiado com aquilo que o futuro te reserva)

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