A falsa humildade está a prejudicar a tua vida?

Durante muito tempo pensei que a humildade fosse uma qualidade desejável.

Porque em criança todos aprendemos, de uma forma ou de outra, que qualquer tentativa de gabarmos os nossos feitos é uma atitude feia e egoísta que devemos banir da nossa personalidade.

Aprendemos então a recusar os elogios com um sorriso vago, a confiar a nossa sorte nas mãos dos outros e do universo. E por fim, passamos a ver as nossas conquistas como algo deveras desinteressante e pouco digno de louvor.
Sadness (créditos da imagem: Eero Alava)

Com o tempo aprendemos também a pregar essa humildade. A enaltecer os seus pontos positivos. E nunca, em todo este tempo, nos preocupamos em descobrir e explicar o seu significado.

Como resultado, nos dias que correm, abundam os falsos humildes que culpam o mundo pelas suas angústias e se sentem ofendidos pela felicidade dos outros.

E isso, meus queridos, não podia estar mais longe da verdadeira humildade.

A diferença entre a verdadeira e a falsa humildade


Para aprender novos conceitos é necessário passar por um processo de digestão. Em que os factos crus que recebemos através da educação devem ser reciclados.

Devemos duvidar da informação que enche os nossos sentidos. Devemos questioná-la e encontrar a verdade através dos nossos próprios meios. Só assim a vida fará mais sentido para nós. Só assim podemos realmente evoluir.

O que tem isto a ver com a humildade?

Tudo.

Nos dias que correm, raras são as vezes em que nos atrevemos a questionar o significado da humildade. Ela leva-nos a adoptar atitudes servis e submissas. Leva-nos a invejar a sorte alheia, a saborear com amargura as nossas derrotas e a enxotar as pessoas que teimam em exibir a sua felicidade.

Como se não fossemos capazes de a suportar, como se essa felicidade nos lembrasse constantemente da nossa própria miséria.

Mas os nossos lamentos não podem ajudar-nos a crescer. E certamente, não é por amaldiçoares a sorte dalgumas pessoas que a vida te parecerá menos escura.

O efeito da humildade na nossa felicidade


No fundo, felicidade e humildade têm uma relação íntima muito poderosa. No entanto, em toda esta era da informação aprendemos a esperar a felicidade como esperamos por comida num qualquer “take-away”. Pondo algumas moedas no balcão e esperando que nos sirvam uma deliciosa refeição.

Recusamo-nos a acreditar no nosso potencial. Pensamos que quem tem que acreditar em nós são os outros. São eles que nos devem lembrar constantemente quem somos e do que somos capazes. Caso contrário não merecemos conquistar nada de valor no breve tempo que pisamos esta terra.

Bem, pelo menos é mais fácil acreditar nisso. Porque a falsa humildade com o tempo torna-se um hábito que vai corroendo a nossa auto-confiança. E quando nos conformamos com esse hábito deixamos de questionar e, por isso, ficamos cegos à realidade.

E a realidade é que a falsa humildade é apenas mais uma desculpa para não nos conhecermos melhor a nós próprios. Talvez tenhamos medo daquilo que podemos encontrar.

Conformarmo-nos com a falta de amor próprio é matar a nossa possibilidade de ser bem sucedidos, é sacrificar a oportunidade de vencer e conformar-se com um simples prémio de participação.

Eu percebo o atractivo da humildade. Porque ao sermos humildes estamos a afastar de nós as críticas: quem é que vai criticar uma pessoa auto-crítica? Por isso, em vez de dizermos “eu dei o meu melhor e estou orgulhoso”, preferimos dizer que “não foi nada de especial”.

O problema dessa atitude é que na ausência das críticas estamos também perante uma ausência de reconhecimento e de verdadeiras conquistas.

O que há de errado em reconhecer os nossos talentos?


Numa sociedade abundante em conselhos sobre como aumentar a nossa auto-confiança começa a parecer ridículo as críticas que reservamos a quem se atreve a reconhecer, em público, as suas forças.

Muitos consideram egoísta correr atrás das nossas paixões, ganhar dinheiro fazendo aquilo que adoramos. Por isso, para não ofendermos as pessoas preferimos ir soltando pequenos suspiros numa sala apinhada de gente na esperança de sermos “descobertos”, em vez de berrarmos em plenos pulmões até que as pessoas que nos rodeiam não sejam mais capazes de desviar o olhar.

Assim podemos atribuir o nosso sucesso (ou fracasso) à sorte pura e desmarcamo-nos de qualquer responsalibilidade de defender os nossos talentos.

Por causa da humildade muitas vezes ficamos à soleira da porta. Tentamos empurrá-la com a ponta dos nossos dedos e quando ela não cede viramos as costas e dizemos a nós próprios: “Eu tentei, mas a porta não quis ceder…”.

É muito mais fácil não fazer uma investida séria. Assim diminuímos a nossa dor. Não íamos ser capazes de qualquer das formas, por isso mais vale não dar o nosso tudo por tudo, assim ainda podemos conservar a nossa vida medíocre vazia de sonhos.

Uma mudança de atitude


A verdadeira humildade é reconhecer as nossas forças, reconhecer as nossas conquistas e a nossa vontade de continuar a lutar. É dar o nosso máximo mesmo quando não temos plateia, é tropeçar, partir um braço ligá-lo e continuar a lutar. Mesmo sendo conscientes de que não passamos de um grão da areia no nosso mundo.

Muitas pessoas que pregam a humildade (e invejam secretamente o sucesso dos outros) pensam que quem admite as suas qualidades tem uma noção exagerada da sua importância. Preferem chamá-los de pavões e dizer que falam de bico cheio em vez de escutar a sua sabedoria.

Na verdade, as pessoas que baniram essa falsa humildade das suas vidas têm perfeita noção dos seus defeitos e fraquezas. Mas preferem continuar a lutar, em vez de ficarem parados na lama à espera de um qualquer salvador de banda desenhada.

Preferem também reconhecer as suas qualidades e investir de forma séria nos seus sonhos. Em vez de ficar à espera que alguém venha tecer elogios às suas capacidades.

Por isso, em vez de andares por aí a exibir as tuas feridas recomendo que comeces a agir. Não cries um blogue e desistas dele passado uns meses só porque não tens comentários apesar de estares a dar o teu máximo.

Não desistas só porque existem no mundo imensas pessoas famosas e bem-sucedidas. O mundo não precisa de mais nenhum José Mourinho, J.K.Rowling ou Messi, o mundo precisa de TI. Por isso, não desistas sem teres tentado a sério sequer, sem teres provado o sabor das lágrimas e teres tentado de novo, de novo e de novo.

Na vida não existem os sortudos que recebem tudo sem esforço e os azarados que não recebem nada. Isso não passa de uma ilusão romântica que temos da vida. Porque, na verdade, nesta vida existem aqueles que vencem e se recusam a desistir, aqueles que celebram as suas vitórias e se orgulham das suas derrotas. E existem aqueles que apenas insultam os que se atrevem a viver.

Qual deles queres ser?

11 comentários:

Jorge Purgly | 18 de janeiro de 2011 às 08:36

É importante saber distinguir entre autoestima, falsa humildade e humildade virtude.

A humildade virtude, oposta ao orgulho é altamente desejável e necessária a pessoa e à sociedade.

A auto estima elevada também.
Em pessoas maduras ambas convivem perfeitamente.
Um abraço,
Jorge Purgly

Principe Encantado | 18 de janeiro de 2011 às 08:38

Muito boa a matéria e real é por ai mesmo que as situações desenrolam.
Fechou com chave de ouro: "E existem aqueles que apenas insultam os que se atrevem a viver."
Abraços forte

Ana Reis | 19 de janeiro de 2011 às 23:26

Olá Principe. Obrigada pelo teu comentário.
Fico feliz que tenhas gostado e que partilhes da minha opinião. Esta matéria saiu mesmo em tom de conclusão depois de anos a lidar de forma difícil com o tema.
E é cada vez mais importante que se saiba distinguir entre uma verdadeira e uma falsa humildade.
Um grande abraço

Ana Reis | 19 de janeiro de 2011 às 23:32

Olá Jorge, muito obrigada pela contribuição. A sua visão enriquece o artigo. A humildade (a verdadeira) é uma grande virtude e implica uma grande flexibilidade e capacidade de criar e sentir empatia em relação às pessoas que nos rodeiam.
Penso que o caminho para o humildade é muito pessoal. Ninguém nos pode dar um mapa, temos que ser nós a descobrir. Porque a humildade é algo que não pode ser copiado, que tem que nascer de nós próprios e que tem que ser do nosso jeito.
Mas antes da humildade é preciso aprender a dar valor aos nossos feitos e capacidades. E, com o tempo, a humildade aparecerá enquanto abrimos o nosso coração para que o mundo inteiro possa entrar.
Um grande abraço

Tweets that mention A falsa humildade está a prejudicar a tua vida? | A Revolução da Mente -- Topsy.com | 20 de janeiro de 2011 às 00:06

[...] This post was mentioned on Twitter by Fábio Jesuíno. Fábio Jesuíno said: RT @anacatarinareis: A falsa humildade está a prejudicar a tua vida? - http://goo.gl/Llfik junta-te à discussão! [...]

Isabe Madureira | 20 de janeiro de 2011 às 11:10

Adorei!
Há tempos atrás tentei explicar isto a algumas pessoas, principalmente a minha mãe, que teimava em dizer que eu tinha de ser mais humilde. No meio de tanta emoção que essas situações me causavam, nunca consegui expressar o que pensava duma forma clara e assertiva. Tu conseguiste! Obrigada, Ana

Ana Reis | 20 de janeiro de 2011 às 22:50

Olá Isabel! Estou muito contente por receber um comentário teu :) Surpreendeste-me!

Sinceramente, foi ao escrever o artigo que consegui definir tão bem aquilo que sinto e penso em relação a este tema. Antes disso tinha uma vaga ideia, mas nada que pudesse encher uma página (ou assim pensava eu).

A humildade também é para mim um assunto sensível. E diante dalgumas pessoas de pouco valem as explicações, por muito boas que sejam. Mas fico feliz que este artigo te tenha ajudado a pensar duma forma mais clara.

Bjocas grandes

Yolanda | 23 de janeiro de 2011 às 01:47

Sempre aprendo com teus escritos,amiga Ana.
Você disse bem: devemos mostrar nosso potencial e falar sobre eles, porque é isso que nos empurra para a frente.
Penso que se não expomos o melhor de nós, quem saberã?
Obrigada por compartilhar.
Meu afetuoso abraço,
Yolanda

Ana Reis | 23 de janeiro de 2011 às 10:44

Olá Yolanda! É muito bom receber um comentário e uma visita suas aqui no blogue.
É verdade, passamos tanto tempo a esconder-nos atrás dos nossos defeitos que não deixamos que ninguém veja o nosso imenso potencial.
As nossas qualidades nem sempre nascem connosco, às vezes, necessitam de ser trabalhadas. E isso é algo que muitas vezes custa acreditar. Preferimos pensar que se não temos jeito para algo à partida, mais vale desistir. E, por isso, muitos talentos se perdem antes de serem sequer descobertos.
Um grande abraço

André | 26 de janeiro de 2011 às 23:27

Identifico-me em larga escala com este post. Para dizer a verdade, acho que me é intrínseca a noção de não me vangloriar dos meus feitos, disfarçando isso com alguma confiança. É um pouco contraditório e difícil de explicar.
Acontece que nos momentos em que atiro os "já estava à espera", por me ter esforçado por isso, isso fica marcado nos outros, que me julgam falso humilde. A verdade é que tenho bem presente a noção supra citada mas em momentos escassos ouso fazer uma congratulação quase muda e isso "descamba-me" a verdade inicial. Tópico difícil este.
No somatório, penso que tudo se resume às pessoas com quem convivemos e o grau de conhecimento que temos de nós.

PS: As referências utilizadas encaixam na perfeição. É que na verdade, o Mourinho não deixa de ser humilde porque é auto-confiante.

Ana Reis | 27 de janeiro de 2011 às 18:53

Olá André! Sê muito bem vindo ao meu blogue e obrigada por partilhares a tua experiência.

Na verdade eu também sempre pensei que o hábito de não me vangloriar dos meus feitos era intrínseco. Mas depois percebi que esse hábito é mais uma questão cultural, acredita que não és o único a sentir isso. A falsa humildade é algo que vamos cultivando forçosamente, algo que aprendemos na infância e vamos mantendo.

É possível ser um falso humilde e confiante ao mesmo tempo? Sim, é possível. Mas são duas características que colidem muitas vezes. E é como disseste, por vezes uma congratulação quase muda isso. Mas não definitivamente.

Eu compreendo muito bem esse sentimento. Mas acredita, não precisas de te congratular em público para superar a falsa humildade. É apenas uma questão de atitude, é trocar o "foi sorte" por um simples "estou feliz por ter conseguido" ou o "não foi nada de especial" por um simples "obrigado".

Não podemos estar dependentes dos outros nesse aspecto senão nunca vamos ter confiança suficiente nos nossos talentos.

Um grande abraço e obrigada pelo teu comentário

P.S. Sou grande admiradora do Mourinho, a atitude dele ensinou-me mais sobre a confiança que 100 livros de auto-ajuda. Ele vive de dentro para fora e não deixa que os outros definam as suas capacidades, e para isso é preciso muita coragem!

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