2 com

A busca pela sabedoria interior

Este artigo é a continuação d'O valor da solidão.

Acredito que para muitas pessoas seja difícil aceitar que desconhecemos muito do funcionamento da nossa mente. Mas a verdade é que ela se torna mais acessível quando nos dispomos a ouvir.

A sua voz chega-nos de muitas formas diferentes: através de sonhos, de intuições, de impulsos. Chega-nos também quando abrimos um livro qualquer ao acaso e lemos uma passagem para encontrar respostas à nossas dúvidas, ou quando conversamos com amigos. E por vezes, mesmo depois de já termos lido ou ouvido aquela frase dezenas de vezes algo nos salta à vista e atinge-nos como um raio, tornando a realidade mais clara para nós.

créditos da imagem: Taylor MacBride

Essa explosão de claridade acontece porque algo dentro de nós ressoa com aquilo que acabamos de ler ou ouvir. O que significa que para encontrar aquilo que é verdadeiramente importante devemos encontrá-lo primeiro dentro de nós. Porque a crença de que os maiores tesouros são físicos por vezes leva-nos a adiar de forma constante a nossa felicidade, até não existir nada mais nas nossas vidas do que a obsessão pela conquista dos nossos sonhos.

A busca interior é a mais importante de todas e a maior aventura na qual poderemos embarcar. No entanto, não devemos cair no extremo do isolamento, porque a busca interior é uma forma de crescimento para tirar maior proveito desta vida, não um substituto da própria vida.

Onde deve começar a busca interior?

Raramente por onde nós queremos. Na exploração dessa sabedoria interior devemos adoptar duas atitudes essenciais:
  • A primeira é aprender a escutar;
  • E a segunda, largar a necessidade de controlar a direcção dessa exploração.
A sabedoria interior é sempre superior às nossas expectativas. Isto ocorre porque acreditamos que os nossos pensamentos superficiais nos definem e acabamos por esquecer a imensidão da nossa mente e a nossa frágil compreensão do seu funcionamento.

Por isso, devemos deixar que a nossa mente nos leve aos sítios que temos que ir, não nadar contra a corrente para chegar aos sítios onde achamos que devemos ir.

Um exemplo disso é quando tentamos, em desespero, lembrar algo que esquecemos. E, por muito importante que essa informação seja, raras vezes somos capazes de a recordar. No entanto, quando desaparece essa pressão damos por nós a lembrar todos os detalhes que antes não conseguíamos evocar.

Mas afinal o que é a busca interior?

Não é uma forma de visualização ou de sonho consciente, nem sequer é um tempo para rever de forma repetitiva os nossos pensamentos e as nossas vidas. Numa frase: explorar é meditar e é também a ausência de pensamento.

A meditação, principalmente no mundo ocidental, tem sido vista como algo esotérico e estranho, o refúgio dos fracos e marginalizados. Ainda hoje para a maior parte das pessoas é motivo de chacota e uma grande perda de tempo.

Não quero aqui perder-me na enumeração dos benefícios comprovados da meditação, existem outros que o fazem muito melhor do que eu. O que quero realçar sobre este tema é que a meditação é importante porque nos torna conscientes de que somos superiores aos nossos pensamentos e que somos responsáveis pelas nossas escolhas e pelo rumo das nossas vidas.

A meditação é uma prática que marca pela sua simplicidade. Em palavras de Osho a meditação começa por…
…“estar separado da mente, como uma testemunha. Esta é a única maneira de te separares de qualquer coisa. Se estiveres a olhar para a luz, naturalmente uma coisa é certa: tu não és a luz, és aquele que está a olhar para ela.
Se estiveres a olhar para as flores, uma coisa é certa: tu não és a flor, és o observador. A observação é a chave da meditação. Observa a tua mente.”

Se quiseres experimentar meditar aconselho uma rotina simples (a minha rotina):

  1. Senta-te numa posição confortável, pode ser de pernas cruzadas ou numa cadeira que te permita manter uma postura correcta;
  2. Fecha os olhos e respira consciente e profundamente repetindo mentalmente a palavra “relaxa” até te sentires relaxado;
  3. Quando te sentires fisicamente relaxado inicia a contagem decrescente de 20 até 0. E cada número sente-te relaxar cada vez mais profundamente;
  4. Neste estado os ruídos não devem incomodar-te, tenta esvaziar a tua mente de qualquer pensamento. Isto no inicio é impossível, por isso, de cada vez que surgir um pensamento não o julgues nem tentes justificá-lo ou correr atrás dele, simplesmente respira fundo e aceita-o.
Para começar bastam 10 minutos por dia. E se o fizeres correcta e regularmente cedo sentirás os benefícios: uma mente mais calma e consciente.

E vocês, alguma vez praticaram meditação? Contem-nos a vossa experiência.
5 com

O valor da solidão

... é das coisas que mais me assusta, estar sozinha a ouvir o som da minha própria voz.

Poderia começar hoje mesmo a distribuir inquéritos para perceber o que é a solidão e tenho a certeza que nunca o entenderia completamente. Porque a solidão não é só a ausência dos outros, a solidão é também quando conseguimos estar mais perto de nós e de Deus.

E assim como não existem duas pessoas iguais, não existem dois conceitos de Deus iguais e por isso a solidão torna-se algo muito diferente para cada um de nós. Impossível de definir.

"Todos os seres humanos têm medo da sua própria solidão.
Mas apenas na solidão nos podemos conhecer completamente,
e aprender a lidar com nossa eterna solidão."- Han Suyin 
(créditos da imagem: Leonard John Matthews)

No entanto, acredito que existem claramente dois tipos de solidão. Aquela solidão coberta de mágoa, à qual tentamos escapar enchendo os nossos dias com actividades inúteis que nos impedem de pensar profundamente sobre o sentido das nossas vidas, e o tipo de solidão propositada. E é sobre esta última que desejo falar.

Quando reservamos propositadamente um tempo a sós, longe do mundo, dos outros e de qualquer tecnologia experimentamos sentimentos bem diferentes do comum vazio da solidão acidental. Mas na verdade, ficar sozinho(a) é bem mais difícil do que aquilo que à primeira vista nos parece.


Devemos preferir o isolamento à interacção social?

Só nos últimos anos se tornaram visíveis movimentos que defendem o valor do silêncio e da solidão propositada (pelo menos no mundo ocidental). Mas antes disso a solidão era algo muito negativo reservado apenas a pessoas que desejavam afastar-se da sociedade.

Quando pensamos numa pessoa solitária normalmente pensamos numa pessoa marcada pela tristeza e pela mágoa. Pensamos em alguém que não escolheu viver assim, mas foi uma vítima das circuntâncias da vida. Uma imagem que persiste até aos dias de hoje especialmente devido à sua repetição excesiva nos meios de comunicação e nas obras de ficção como séries, novelas e filmes.

O solitário sempre foi o estranho e marginalizado. Mas penso que chegou o momento de mudar a imagem que temos da solidão. E obviamente, não escrevo sobre a solidão permanente, escrevo sobre uma solidão que devemos aprender a desfrutar na medida certa.


O que significa a solidão...

Acredito que grande maioria das pessoas não é adepta a reservar uns momentos do seu dia para realizar uma espécie de retiro interior. Porque a maioria de nós tem tanto medo do seu interior como dos perigos do mundo cá fora.

Assim, o mais normal é agarrarmo-nos à televisão e à internet quando não temos nenhum programa em especial para o nosso dia. Esses dois meios ofuscam quase completamente a nossa capacidade de pensar profundamente sobre nós e sobre a vida. E constituem a forma mais eficaz de evitarmos a solidão completa e a possibilidade de ouvirmos a nossa própria voz.

Essa voz interior tem caído no esquecimento à medida que prosperam as actividades que ocupam os nossos tempos livres ou as engenhocas que nos impedem de pensar no que quer que seja. Essa voz tem sido conhecida por muitas formas diferentes ao longo da história, para o antigos eram as vozes dos deuses que lhes falavam através de sonhos e perságios, para outros a voz do Universo, em tempos recentes começamos a perceber que essa voz nos pertence, mas ao mesmo tempo parece ter mais sabedoria que nós próprios. Como acontecia com o grilo, a consciência de Pinóquio.

Na minha opinião essa voz que por vezes ouvimos quando menos esperamos é a voz do nosso subconsciente.

A nossa mente é imensa e, por isso, quase nunca somos plenamente conscientes da sabedoria que albergamos dentro de nós. O nosso cérebro funciona por isso como um software intuitivo que faz a ponte entre a nossa consciencia e o abismo profundo que habita dentro de nós.

Existem ainda muitas perguntas por responder acerca da mente e do cérebro, acerca da própria consciencia humana. Mas algo que devemos aceitar é que aquilo que somos transcede a nossa rotina, as nossas preocupações e mesmo os nossos desejos.

Uma verdade que pode ser assustadora para muitas pessoas, já me assustou a mim. É como dividir a nossa casa com um perfeito desconhecido que parece conhecer-nos melhor que nós próprios algum dia seremos capazes de conhecer.

A solidão permite-nos limpar todo o lixo que bloqueia o nosso pensamento (consciente) para podermos encontrar o caminho para essa sabedoria perdida. No próximo artigo escreverei sobre as melhores formas de tirar partido sobre dos momentos em que estamos sós. Até lá espero os vossos comentários.
2 com

Agressividade: um escudo ou uma arma?

A agressividade ou combatividade (como queiram chamar-lhe) é um sentimento intenso, daqueles que devia trazer o aviso de “manusear com cuidado” em enormes letras vermelhas. No entanto, tenho a impressão que muitas pessoas consideram que a agressividade é uma característica unicamente masculina. Uma mentira na minha opinião. Algumas mulheres são capazes de uma violência psicológica tão intensa que que preferia voltar a vestir o meu macacão e levar uns murros nas lutas que tinha com os rapazes na minha infância (quando não existia o preconceito de “eu não bato nas meninas”) do que enfrentar os seus acessos de fúria.

Mas tanto o excesso de agressividade como a ausência dela não são positivas. Suponho que tenha aprendido isso da pior maneira. Na minha adolescência não tinha a mínima tendência para me irritar com os outros. Tentava ser o mais prestável e simpática possível, pensava que só assim poderia fazer amigos de verdade.

Agressividade (fotografia de Chapendra)

Como é óbvio a ausência de agressividade enfraqueceu a minha personalidade. Suponho que muitos possam discordar. Mas a verdade é que o excesso de bondade e a anulação do eu (ao calarmos as nossas opiniões) apenas levam ao sofrimento e isolamento. Embora na altura isso me tenha trazido muitas mágoas, o que ganhei em troca fez com que eu nunca guardasse raiva ao rancor desses anos mais escuros da minha vida (espero escrever um artigo sobre o tema muito em breve).

Por isso, desde essa época da minha vida percebi que um pouco de agressividade é indispensável nesta vida. É uma forma de pôr um travão quando as pessoas passam o limite da decência e começam a explorar o nosso bom coração.


O que é a agressividade?

A agressividade contudo não é uma emoção, é uma consequência de uma emoção. Num livro que li recentemente: “O espírito da Igualdade” de Wilkinson e Pickett (leitura recomendada: podes comprar na Fnac ou na Amazon), percebi que a maioria dos crimes violentos acontecem pelas mãos de pessoas que tentam reaver a sua honra ou dignidade depois de terem sido delas despojados em situações humilhantes.

A agressividade e a honra andam sempre muito próximas. Principalmente nas camadas mais pobres da sociedade, a violência é quase sempre uma forma de protesto, porque na falta de outro tipo de poder somos forçados a usar aquele que nos sobra. E desconfio que uma solução pacífica estaria fora de questão para a maioria das pessoas em casos de extrema humilhação.

O acto de agredir é uma forma de recuperarmos o que é nosso por direito, e uma forma de defendermos a nossa dignidade e honra. Por isso, quando somos insultados ou criticados injustamente tendemos a responder com a mesma intensidade e intenção de magoar. O agredido passa então a agressor e, apesar de um pouco de agressividade ser indispensável para nos protegermos, há que saber quando quebrar o círculo.

No fundo não existe nenhum mau da fita neste cenário. Todos nós, nalguma fase da nossa vida, agredimos alguém verbal ou fisicamente e sofremos o mesmo destino nas mãos de outras pessoas. Na realidade, muitas vezes uma agressão é um acto inconsciente e involuntário. Por vezes, numa conversa dizemos algo que não sentimos apenas para magoar a outra pessoa, e acabamos por nos aperceber do efeito das nossas palavras tarde demais.

Por isso, a todos os filósofos que prosperam ao expor a podridão da sociedade actual tenho pena de dizer que a sociedade actual não está a perder por completo os seus princípios. Na maioria das vezes apenas somos vítimas da nossa própria inconsciência e a agressão é muitas vezes a única forma que conhecemos para recuperar um pouco do nosso poder e honra dentro de uma sociedade cada vez mais conformada com o ritmo das coisas.

Aprender com a agressividade...

O desenvolvimento da inteligência emocional não se trata de mudar a nossa personalidade. Trata-se, pelo contrário, de mudar a forma como nos vemos a nós próprios e a forma como encaramos o nosso mundo. E, na maioria das vezes as mudanças que desejamos para os outros nem sempre são aquelas que essas pessoas necessitam.

Aprender a lidar com emoções difíceis só é possível se te aceitares por completo como és actual. Não fazer isso seria como te rejeitares a ti próprio, e seria a receita certa para uma vida cheia de frustração e insatisfação. Se não te aceitares podes percorrer o mundo inteiro que tudo o que alcançares te parecerá insuficiente.

Portanto, em vez da mentalidade do: “quero saber o que estou a fazer de errado na minha vida” espero que possas, com as minhas palavras mudar para a mentalidade do: “o que é posso fazer com aquilo que possuo para alcançar uma vida melhor”.

Aprender a conduzir e a mergulhar foram talvez as situações que mais testaram os limites da minha paciência e a minha capacidade de permanecer calma em situações de grande tensão. Só quando comecei a conduzir me apercebi da barbaridade dos comportamentos dos portugueses nas estradas. Insultar o condutor do lado é possivelmente o acto mais comum dentro dum veículo no meio do trânsito, especialmente se o condutor for jovem ou do sexo feminino. Suponho que as jovens mulheres são capazes de confirmar por si mesmas este facto.

Na realidade, a pressão nas estradas portuguesas é tão grande que os jovens condutores depressa tendem a adoptar os comportamentos insanos dos condutores mais experientes, e, em breve estarão a buzinar e a vaiar o condutor que se esforça por conduzir com cuidado na selva urbana. Porque a pressão social se torna demasiado forte em muitas áreas da nossa vida, tendemos a imitar os comportamentos dominantes na sociedade onde estamos inseridos.

Não existe nenhuma receita mágica para controlar a agressividade, nem a nossa nem a das pessoas com quem interagimos. Mas percebi que encontrar as razões por detrás dos nossos comportamentos agressivos é um excelente sítio para começar.

Nem sempre as nossas razões para reagirmos com agressividade são óbvias, principalmente para nós próprios. Suponho que por vezes as verdadeiras razões nos assustam demasiado. Mas é preciso forçar. Só quando nos sentamos e nos tornamos disponíveis para ouvir os nossos medos é que podemos perceber por completo a origem das nossas atitudes.

Não é em um só dia que ficaremos a perceber tudo, mas a verdade é que a explicação mais simples costuma ser a mais verdadeira. Os sentimentos que mais comummente desencadeiam reacções agressivas são:

  • Insegurança
Tendemos a reagir de forma agressiva quando alguém põe em causa as nossas capacidades. Especialmente quando nós próprios temos pouca auto-confiança. Pessoas muito agressivas costumam ser pessoas muito inseguras, por isso a agressão é uma forma de exprimirem o desejo de serem reconhecidas.

  • Injustiça
Quando sentimos que não recebemos ou que nos retiram algo que é nosso por direito, muitas vezes a única forma que temos de recuperá-lo é sendo agressivos.

  • Impotência
Quando deixamos de ter qualquer controle sobre as nossas vidas a violência torna-se numa forma de reivindicar aquilo que é nosso por direito.


  • Humilhação
Suponho que já todos nós passamos por situações humilhantes. Ser o alvo de gozo e críticas é uma forma de agressão capaz de quebrar a personalidade de muitas pessoas. O mais normal é que depois de repetitvas situações humilhantes as pessoas acumulem raiva e angústia que, mais tarde ou mais cedo, acabam por se manifestar em comportamentos agressivos.

Portanto, a agressividade não só é um escudo das nossas emoções, como é uma arma muito poderosa. Mas para tirarmos o máximo partido daquilo que agressividade pode fazer por nós é necessário que percebamos por completo as nossas motivações.

Essa compreensão não só nos permite usar essa força de forma mais moderada e eficaz para conseguirmos aquilo que queremos da vida, como nos ajuda a lidar melhor com a agressividade dos outros.

Aguardo os vossos comentários.
Até breve
Related Posts with Thumbnails