Esta crise vai devorar-nos?

Promessas vazias. É tudo a que temos tido direito nos últimos tempos.

Ao ver aquele bando de tolos engravatados a passear-se diante das câmaras de televisão apenas consigo pensar: existe ainda um governo que possamos culpar?

créditos: Matthew


Porque tudo o que vejo é um grupo de homens obesos e suados a tentarem proteger os seus interesses enquanto o país colapsa à sua volta.

É triste. E é nesta época de crise que as pessoas decidiram começar a atacar-se umas às outras. Porque os jovens de hoje são preguiçosos, porque os empresários sacrificam o futuro dos jovens para manterem o seu nível de rendimentos, porque o governo é tirano e corrupto, porque… enfim, não me apetece continuar.

Até porque anos de críticas e insultos mostraram ter um efeito tremendamente positivo no rumo do nosso Portugal. Espera aí, parece que não.

Torna-se quase irresistível criticar e culpar os outros. Mas a realidade é esta. Nunca os jovens estudaram tanto, nunca estivemos tão bem preparados.

E por isso hoje temos que lidar com a imensidão de licenciados, mestre e até doutorados que têm que submeter-se a um trabalho ranhoso onde conseguem ganhar apenas 3euros por hora.

A realidade


Tudo para conseguir um pedacinho da independência financeira. Uma independência que tiveram que adiar para concluir o curso com boas médias e para gozar um pouco da despreocupação da vida académica.

Mas acabando esse período a vida atinge-nos com força. Demasiado qualificado, não tens experiência, até gostamos de ti mas não estamos a contratar pessoas. São as desculpas mais vulgares para o desemprego dos altamente qualificados.

E quem o diz são os empresários e profissionais já bem estabelecidos. Mas parece-me que esses quadros de topo se esqueceram que, quando começaram, tiveram alguém que acreditasse neles. Porque nessa altura uma pessoa podia começar a sua carreira pelo fundo e subir de escalão pelos seus próprios esforços.

Mérito. Foi como se construíram as empresas que agora nos dominam. Mas o mérito deixou de ser suficiente. Porque o trabalho se tornou escasso. E porque, frente a uma massa de jovens tão bem qualificados o mundo se tem portado como um menino mimado: guardando o dinheiro e privilégios todos só para si.

E o governo nada tem feito a não ser preocupar-se com a sua salvação.

Faz-me lembrar aquela cena do "Titanic" em que todos começam a correr para os botes de salvamento na iminência de um naufrágio.

Mas enquanto no Titanic se deu prioridade às mulheres e crianças, em Portugal, são os nossos modestos governantes os primeiros a embarcar. E enquanto se enfiam nos botes, sorrateiramente, continuam a passar o discurso do “está tudo bem” para desviar a nossa atenção da iminente colisão com o enorme iceberg da crise económica.

Portanto, ponto da situação:



  • Temos uma montanha de jovens qualificados a submeterem-se a empregos ranhosos em troca da independência financeira,

  • Temos jovens que nem um trabalho ranhoso conseguem arranjar e têm que enfrentar uma situação de desemprego imatura,

  • Temos empresários bem estabelecidos a portarem-se como meninos mimados,

  • E temos, finalmente, um governo feliz, a embarcar nos botes de salvamento enquanto o país se destrói a si próprio em insultos e críticas.

“Vou mas é voltar para a ilha!”, tenho a certeza que diria o nosso querido náufrago da série "Maré-Alta".

Diria que neste momento de crise, ficar é para os fortes. Porque a situação não vai melhorar nos próximos tempos.

Mas enquanto andei por aí a pedinchar por estágios, tive a oportunidade de reflectir sobre tudo isto.

E, por aquilo que vi e ouvi ainda existe um caminho. É estreito, é sinuoso, é doloroso. Mas se trabalharmos todos juntos somos bem capazes de conseguir.

O que falta é criar emprego. E não o podemos esperar das grandes empresas. Com os seus quadros paralisados e os seus executivos afundados naquelas belas cadeiras de escritório que reduzem as dores de costas.

Tampouco podemos esperar que o governo crie emprego. Basta ver a situação dos funcionários públicos e dos professores que eles querem, amavelmente, pôr no olho da rua. Tampouco devemos ter esperança na nobre profissão de cientista e investigador. Porque nesta área temos as mãos e os pés atados, e, por causa da crise avizinham-se cortes que irão deixar muitos profissionais sem trabalho.

Uma solução


Ainda podemos desviar-nos do iceberg. Mas para isso temos que reclamar o nosso poder de volta. Temos que criar o nosso próprio emprego, temos que ser empreendedores.

E isso será difícil, num país onde quase ninguém sabe o que significa uma incubadora de empresas. Um país que tem uma das mais baixas taxas de empreendedorismo da Europa.

Mas a resposta para esta crise é essa. Inovar, arriscar, criar empresas. Sim, mesmo jovens licenciados que têm ainda pouca experiência de trabalho. Porque vamos ser realistas, não podemos esperar que a actual geração de trabalhadores nos estenda a mão. Temos que ser nós a reivindicar o nosso valor, a enaltecer as nossas capacidades.

É preciso ter paciência, estudar o mercado, aprender os ofícios. Mas não esperes subir na vida à conta de outrem. Não esperes uma oportunidade dourada e um cheque chorudo. Porque no Portugal de hoje temos que ser nós a fabricar as nossas próprias oportunidades.

Vou deixar-te pensar nesta ideia ao som da nova música dos Deolinda que ameaça já converter-se no hino da crise e da geração “à rasca”.

2 comentários:

Anonymous | 10 de fevereiro de 2011 às 23:52

Olá Ana querida!
Bem, pelo que vejo, a situação é a mesma em quase todos os países... As cenas que você descreveu me fazem lembrar do nosso Brasil... Com a diferença, claro, que ainda temos muito o que investir nos jovens, em estudos, fortalecer essa importante base que é a educação, para que o "futuro" esteja mais qualificado para enfrentar o rombo que ano após ano vai se formando...
Enfim, minha querida...se você cruzar o oceano vai reconhecer Portugal de algumas formas...
Grande beijo,
Jackie

Ana Reis | 11 de fevereiro de 2011 às 13:10

Olá Jackie, obrigada pelo comentário!
Infelizmente é verdade. São muitos os países que estão a enfrentar crescentes taxas de desemprego. Nem Espanha, a nossa forte vizinha se safa.
Mas eu continuo a achar que o Brasil tem um potencial de crescimento gigantesco (pelo menos é o que todos pensamos deste lado do mar!). E ao contrário de Portugal que se tem acomodado temos assistido a um Brasil que se torna mais forte a cada dia. Um Brasil que não tem medo de arriscar.
Aqui acontece o contrário. As pessoas não querem arriscar. Os impostos continuam a subir e os salários a descer. Enquanto o preço a pagar para manter o nosso nível de vida obriga muitos a viver na miséria.
E ainda estão à espera que volte o optimismo. Como há-de uma pessoa consumir para pôr a economia a mexer se o governo nos corta cada vez mais as "asas" só para manter a aparência de que está tudo bem?
Este é um assunto que me toca muito pessoalmente. Por isso sei que qualquer resposta a comentários não poderá nunca ser objectiva.
É a dor de uma nação a ruir...
Obrigada pela visão do outro lado do Atlântico :)
Beijos

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